[Make the hair stand up on your arm, teach you how to dance inside the funny farm. Not alone, I'll be there. Tell me when you wanna go... (Red Hot Chili Peppers)]
Confesso que pouco me importa que seja hoje uma noite sabatina. A vida boêmia já não traz os mesmos atrativos de outrora. Você já não está mais lá para sentar-se na cadeira à minha frente. Esqueço da diversão que poderia vir. Acabo por ficar em casa e inebriar-me em algumas conjecturas e outros tantos pensamentos afins. Acabo por esquecer-me de muita coisa. Inclusive uma de que não gostaria nem um mínimo que fosse de esquecer... Seu rosto. Não desejo esquecer em hipótese alguma aquele rosto que esqueci de beijar quando lhe vi pela última vez. Aquele mesmo rosto que esboçou um sorriso e disse um “até breve” com ar de “um dia nos veremos”, aquele mesmo rosto agora apaga-se gradualmente de minhas memórias.
Ao entardecer desse monótono sábado, percebi que não me recordava da cor de seus olhos. Interroguei-me por um breve instante até que a impaciência, um dos meus variados defeitos, fez com que a busca se tornasse mais profunda. E, aprofundando-se, quis arrancar a pele de meus braços. Tal foi o desespero que me abateu naquele instante. Eu não conseguia recordar-me de seus olhos, de sua boca, nem um mísero detalhe que fosse. A imagem de seu rosto tornara-se um borrão indecifrável que nem o mais antigo dos moradores da Casa Verde arriscaria ali achar uma figura qualquer.
Redobrei os esforços, recuperei as esperanças. Em um cantinho, lá no fundo de uma mente aturdida com o acontecido, encontrei. Pequenos trechos. Um poema que certa vez lhe escrevi. Sem um final ainda decidido, nem ao menos um começo eternizado. Outro fato que me percorreu a vaga lembrança de seu nome foi um rio. Um rio que nascia de suas mãos quando estas acariciaram minha face. Dessa nascente jorrou intermitente inspiração que me levou dias e mais dias frente aos escritos. Decifrando sentimentos que não se sabe de onde surgiam. Mas surgiam e jorravam.
O que não sei dizer ao certo é onde anda a tal nascente. O rio continua a acertar-me com a violência das maiores já vistas. Os sentimentos atenuaram-se ou até extinguiram-se. Os escritos continuam a brotar em mim a mesma devoção, talvez arrisque eu dizer que a veneração seja até maior nos atuais dias. Já aquele rosto. Aquele rosto apaga-se. Não porque eu peço, mas porque ele assim roga-me. Talvez, com algum esforço, eu consiga lembrar daquele poema, e quem sabe, refeita essa memória, as outras passem a ressurgir aos poucos. Talvez passem a reconstruir-se lentamente, em um processo inverso ao ocorrido com seu rosto. E, Deus sabe, talvez ele também retorne a seu devido lugar em minhas lembranças.
Um comentário:
lindo como você
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