quinta-feira, 19 de março de 2009

Aluga-se...

[Já não sou mais o mesmo, mas ainda me lembro do que eu costumava te falar. Não se preocupe comigo, não vou estar no caminho. Não se preocupe comigo, prefiro seguir sozinho... (Houdini)]

Não sei ao certo, mas se tornou um pouco estranho falar do passado. Até uns tempos atrás era um motivo de orgulho, pois me fez quem sou hoje. Era uma vitrine que eu limpava todo santo dia para tornar límpida a visão da podridão que se expunha naquela loja. Era tão suja por dentro que precisava ser limpa por fora. Os produtos oferecidos não eram do melhores, tinham uma origem desconhecida, com uma qualidade duvidosa.
Mas aquela loja fechou-se, para uma breve reforma, apenas três semanas. Foram suficientes para o momento. Foi o bastante para retirar a crosta de poeira das paredes e dos móveis, extrair as manchas da parede. Bastou para torná-la minimamente apresentável.
Sucedeu que passou por outras várias reformas ao longo do tempo. Fez alguns bons contatos, conheceu novos fornecedores com quem passou a fechar grandes negócios. Os produtos foram substituídos e a clientela agradeceu.
Peço desculpas pela metáfora, mas pareceu-me um pouco interessante e muito fácil de se entender. Não encontrei modo menos monótono de tratar esse passado recente. Um passado recente que ainda arde. Não pelo mesmo motivo de outrora. Há uns poucos meses eu ainda ouvia um instigante crepitar, ainda sentia as fagulhas queimarem a minha pele. Eu ainda sentia o calor quando ele tornava meu rosto claro.
O fogo ainda existe, minhas conjecturas impedem-me de negá-lo. Ele existe, mas já não reside no mesmo endereço. Sabe-se lá onde foi parar, mas ainda queima, com outro combustível, com outra sede. Daquele restaram cinzas e alguns pedaços de madeira que não se queimaram completamente, outros que viraram um frágil pedaço de carvão que se desfaz quando dedos os pressionam.
Agora me dou ao luxo de remeter à primeira frase. Não é tão estranho, apenas o é quando trato daquelas cinzas. Já não faz sentido e algo persiste em jogar uma fagulha ao vento para que talvez chegue àquele paradeiro desconhecido e reacenda aquelas madeiras mal queimadas. Não desejo isso, ainda guardo nas mãos as cicatrizes de quando, acidentalmente, segurei firme um pedaço de carvão incandescente.
Por isso, a antiga loja agora situa-se em outro bairro, distante.

2 comentários:

gabi disse...

o passado é chama mal apagada... é uma verdade dentro de nós que ainda só percorreu parte do caminho...

nunca me teria lembrado da metáfora da loja para falar do meu passado... e olha que ja usei bastantes...

adorei ler seu texto!!!

obrigado pela sua visita ao meu humilde blog e pelo seu comentário!!!

seja sempre bem-vindo!!!

;)

gabi

=)

Gaspar Ferreira disse...

também lhe agradeço muito...

volte sempre que desejar...